O Turismo Cinematográfico e o Branding como foco das Film Commissions no Brasil

Ao contrário das tendências da economia geral no Brasil, o setor audiovisual (cinema e TV) está em alta. Puxado por vários sucessos do cinema nacional e pela nova lei de TV paga (Lei nº 12.485/11), o mercado brasileiro audiovisual está passando por uma fase de crescimento impressionante, especialmente, se comparado a outros países da América do Sul. Também, cada vez mais produtores nacionais e internacionais procuram, em várias regiões do Brasil, cenários e locações atrativas para as suas produções de cinema, TV, documentários e publicidade.

Para aproveitar esta tendência, e transformá-la em benefícios concretos nos locais onde os filmes e programas de TV são rodados, as cidades e Estados brasileiros precisam se organizar para receber turistas motivados a visitar tais locais. Eis o chamado “Turismo Cinematográfico”.

O que é o turismo cinematográfico?

O turismo cinematográfico abarca a influência de filmes, programas e séries de TV e publicidade nas decisões de turistas ao escolherem os destinos para visitar. A representação nas telas das cidades e regiões tem um impacto econômico significativo no turismo e no fortalecimento da promoção cultural das regiões.

Apesar de não existirem muitas estatísticas sobre o tema no Brasil, estima-se que o turismo cinematográfico global movimente cerca de 40 milhões de turistas a cada ano. O turismo induzido pelo cinema e pela TV já é considerado uma fonte significativa de benefícios para regiões específicas, e vários países têm orientado toda sua estratégia oficial de promoção turística precisamente em função da difusão das locações onde foram rodados filmes e séries de TV.

Um filme atua sobre o espectador como um folheto virtual, com três vantagens sobre a publicidade turística convencional: é mais duradouro no tempo, alcança um público maior e cria vínculos emocionais ao integrar a paisagem nas histórias e personagens que atraem o espectador de maneira mais intensa.

Exemplos mais conhecidos do turismo cinematográfico

Existem numerosos exemplos internacionais do impacto de filmes e séries de TV no aumento do turismo e visitas a locações específicas para promover o branding de cidades ou países. Veja alguns exemplos mais conhecidos, de acordo com Hudson & Ritchie (2006):

• “Coração Valente”, Escócia: aumento de 300% no ano após o lançamento.

• “Campo dos Sonhos”, Iowa: 35.000 visitas em 1991.

• “Quatro Casamentos e um Funeral”, The Crown Hotel, Amersham, Inglaterra: reservas esgotadas durante 3 anos após o lançamento.

• “Harry Potter”, várias locações na Inglaterra: aumento de mais de 50% em todas as locações de filmagem.

• “Missão Impossível”, Parques Nacionais, Sydney: aumento de mais de 200% em 2000.

• “Troia”, Canakkale, Turquia: aumento de 73% após o lançamento.

Com a ascensão rápida da popularidade de séries de TV na TV por assinatura e VOD (video-on-demand), também surgiram várias locações procuradas por turistas após assistirem seus programas prediletos. Entre os casos internacionais mais conhecidos estão:

• “Game of Thrones”: Irlanda e Belfast

• “Downton Abbey”: Oxfordshire e Highclere

• “Breaking Bad”: Albuquerque, Novo México

No Brasil, muitas cidades estão se movimentando para gerar um “brand” e visibilidade em torno das filmagens de cinema e programas de TV como:

• Recife – recebeu a TV Globo para gravar cenas de “Geração Brasil”.

• Brasília – o cenário da nova minissérie de Fernando Meirelles, “Felizes para Sempre”.

• Rio de Janeiro – “Rio”, a animação de Carlos Saldanha, um cartão postal da cidade.

Embora a estratégia de Turismo Cinematográfico possa ser feita por um órgão oficial do governo, como um Ministério do Turismo ou uma entidade como a Embratur, cabe à film commission local implementar a estratégia e, efetivamente, receber e orientar as filmagens.

O que é uma film commission?

Uma Film Commission (FC) ou escritório de apoio ao audiovisual visa à promoção da cidade ou do Estado como destino privilegiado para a filmagem de produções audiovisuais nacionais e internacionais, para contribuir com o crescimento econômico e a criação de empregos. A função básica da FC é oferecer o atendimento aos produtores com a estrutura e logística necessárias, e realizar a interface com o poder público para facilitar as filmagens.

No Brasil, o interesse por film commissions e o seu potencial para atrair produções audiovisuais tem crescido a cada ano. Desde 2008, pelo menos 15 entidades intitulando-se film commissions surgiram pelo Brasil para promover suas respectivas jurisdições como locais ideais para produções de conteúdo audiovisual. Entretanto, apenas duas film commissions do Brasil constam como membros da entidade internacional de film commissions, a AFCI (Association of Film Commissioners International): São Paulo e Rio de Janeiro.

Em 2009, a proliferação de film commissions no Brasil levou o Governo Federal a criar um Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) para analisar o fenômeno, recomendar providências para organizar a atividade e garantir um patamar mínimo de profissionalismo no setor. No entanto, até hoje, nada concreto foi feito nesse sentido. Além disso, a entidade formada para representar as film commissions no país, a Aliança Brasileira de Film Commissions – ABRAFIC foi extinta, deixando o setor sem representação e apoio.

Por outro lado, pela primeira vez, as film commissions foram incluídas no “Plano de Diretrizes e Metas para o Audiovisual” da Agência Nacional de Cinema – ANCINE, o que pelo menos significa o reconhecimento oficial das film commissions e seu papel positivo na cadeia econômica audiovisual brasileira.

Os desafios

A Rio Film Commission (RFC) tem sido convidada com frequência para oferecer orientação a várias cidades e Estados brasileiros (Nova Friburgo – RJ, Armação dos Búzios – RJ, Balneário Camboriú – SC e Campo Grande – MS) que almejam criar suas próprias film commissions. Considerado um modelo para o país, a RFC tem oferecido gratuitamente explicações de suas funções, alternativas para constituição de pessoa jurídica, operações e administração interna, além do desenho de um plano estratégico que inclui o turismo cinematográfico. Essas iniciativas representam um despertar dos governos locais acerca do quanto pode render um investimento mínimo em estrutura de film commission para gerar benefícios importantes para suas comunidades.

O momento é apropriado para uma reorganização e capacitação efetiva do setor de film commissions no Brasil. Apesar dos Jogos Olímpicos de 2016 estarem concentrados no Rio de Janeiro, espera-se uma verdadeira invasão de jornalistas, cineastas e equipes de filmagem para visitar o país, com o objetivo de criar reportagens sobre a cultura, costumes, gastronomia e outros aspectos da vida brasileira para os espectadores de seus países, ávidos para conhecerem as idiossincrasias do Brasil. São múltiplas oportunidades para promover o turismo cinematográfico em grande escala no Brasil. Ainda há tempo para aproveitar esse momento. Se uma imagem vale mais que mil palavras, uma imagem em movimento vale muito mais!

 

Por Steve Solot, Presidente da Rio Film Commission

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