Prêmio Almanaque: Vincent Carelli

O Prêmio Almanaque desta edição vai para o cineasta Vincent Carelli, criador do projeto Vídeo nas Aldeias e dos épicos “Corumbiara” (2009) e “Martírio” (2016). Estes filmes compõem as primeiras partes de trilogia que se complementará com “Adeus, Capitão”, título que se anuncia explosivo. Afinal, o realizador brasileiro de 63 anos, nascido na França, vai mergulhar em histórias de índios “milionários”. Ou seja, aqueles que, desde os anos 1960, receberam grandes indenizações.

O tom explosivo de “Martírio” nos estimula a esperar outro épico mobilizador. “Corumbiara” começa em 1985, numa gleba, em Rondônia, onde houve massacre de índios. Dez anos depois, o cineasta regressou ao local. E saiu em busca insana por um índio isolado. Com “Martírio”, Carelli registra a tragédia cotidiana do povo Guarani Kaiowá. Se os povos da Amazônia e do Xingu têm territórios para viver, o mesmo não se dá com os Guarani Kaiowá. Estes sobrevivem em Estado da Federação que é o epicentro do agronegócio (MS) e necessitam enfrentar a fúria diária de fazendeiros e parlamentares unidos sob a bandeira da União Democrática Ruralista.

Ao longo de 2h40’, vemos uma espécie de “western” caboclo. Forças poderosas (governador, senadores, deputados, fazendeiros e empresas de segurança) unidas para exterminar os índios e ampliar seus negócios (e eternos poderes). Nunca, em nenhum filme brasileiro, se viu o Parlamento (ou parte significativa dele) tão exposto quanto em “Martírio”. O filme dessacraliza o Marechal Rondon, mostra índios arregimentados pelo Governo Militar para ajudar em práticas de tortura, faz recuo histórico até a Guerra do Paraguai, mergulha no ciclo econômico da Erva-Mate, para que conheçamos a origem de tão sanguinária luta pela posse da terra, e mostra a resistência da língua guarani. E mais: apresenta imagens feitas pelos próprios índios equipados (pelo Vídeo nas Aldeias) com pequenas câmaras. Antes, ouvíamos os índios dizerem que pistoleiros atiravam neles para arrancá-los de seus pequenos nacos de terra. Mas nada víamos. Em “Martírio”, assistimos aos índios gritando e filmando sob o pipocar de armas a serviço da UDR.

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