Fest Latino 2017 – Ariel Mateluna: de Pedro Machuca a Pedro Mapuche

O menino Pedro Machuca, protagonista do comovente “Machuca”, filme que consagrou o realizador chileno Andrés Wood, treze anos atrás, está em São Paulo. Mas, agora, na pele de Pedro Mapuche. Ao invés do encantador rosto moreno do menino da periferia de Santiago, amigo de um filho da elite chilena, ele é agora homem feito. Tem 28 anos e sólida carreira no cinema e na TV. Em seu filme mais recente – “Más Companhias” (Mala Junta) –, que o trouxe ao XII Festival do Cinema Latino-Americano de São Paulo, ele também se chama Pedro, um atuante líder mapuche.

O público que compareceu ao CineSesc para prestigiar a sessão de “Más Companhias”, da estreante Claudia Huaiquimilla, realizadora de origem mapuche, emocionou-se ao ver o ator Ariel Mateluna narrar sua história e defender com paixão a causa do principal grupo indígena chileno.

Ariel tinha 12 anos quando foi escolhido por Andrés Wood para interpretar Pedro Machuca, menino da periferia santiagueira. Na trama, que tem o Chile da ditadura Pinochet como pano de fundo, Machuca se torna amigo de Gonzalo Infante (Matía Quer), menino de pele e cabelos claros e filho da burguesia. Ao tomar contato com realidade que lhe era desconhecida, o bem-nascido Infante passará a questionar sua própria situação.

“Machuca” consagrou o menino Ariel. O filme foi visto por 660 mil espectadores no Chile (uma enormidade num país de 18 milhões de habitantes), foi vendido para dezenas de países e, no Brasil, lançado por Adhemar Oliveira, vendeu quase 40 mil ingressos (dado significativo em se tratando de cinematografia como a chilena, de pequena circulação entre nós). O trabalho do ator mirim causou sensação e ele recebeu o Prêmio Altazor. E sua carreira deslanchou. Seguiram-se trabalhos em diversas séries de TV e em sete filmes (“Pega, Martín, Pega!”, sobre o boxeador chileno Martín Vargas, “Mirageman”, “Mi Último Round”, “El Baile de la Victoria”, “Gênesis Nirvana”, Matar a un Hombre” e, agora, “Más Companhias”).

O filme de Claudia Huaiquimilla foi aplaudido calorosamente pelo público do Festival do Cinema Latino-Americano, que encerra suas atividades na noite desta quarta-feira, depois de exibir mais de cem filmes latino-americanos e caribenhos, em 26 cinemas de São Paulo e Campinas. E, depois de bate-papo com a plateia, os aplausos se multiplicaram para Ariel Mateluna e para sua ardente defesa da causa Mapuche.

“Más Companhias” conta a história de Tano (Andrew Bargsted), jovem desajustado, que depois de furto em uma loja de conveniência, vai morar, contra sua vontade, com o pai, numa precária casa na zona rural. Lá, ele faz contato com Cheo, um tímido jovem de origem mapuche. Conflitos em torno da disputa de terras entre os indígenas e poderosa fábrica de celulose terão trágicas consequências. E é entre o povo mapuche que atuará o personagem de Ariel Mateluna, o jovem Pedro, líder indígena.

O adolescente Tano se sente abandonado pela mãe, que o mandou morar com o pai, um ex-hippie que agora vive de pequenos serviços como mecânico. Suas relações com este pai, que ele mal conhece, são também dificílimas. O jovem é controlado de perto pela “Febem” chilena. A instituição mantém uma assistente social no seu encalço. Contar mais é estragar a fruição deste drama social, construído com personagens sólidos (em especial o Tano, com suas falas cortantes e carregadas de gírias).

Francisca Gavilán – a Violeta Parra de “Violeta Subiu aos Céus”, de Andrés Wood, e a circense de “Ausência”, do brasileiro Chico Teixeira – tem sólida, embora discreta, participação no filme. “Más Companhias” consegue abordar temas espinhosos – delinquência juvenil e luta de povos originários contra grandes grupos econômicos – sem panfletarismo, nem piedade (embora emocione e houve quem terminasse a sessão do CineSesc com lágrimas na olhos).

Ariel Mateluna espera, entusiasmado (depois de dezenas de selfies e abraços chilenos e brasileiros, ao final do debate), que “Más Companhias” seja distribuído no Brasil e que faça pelo menos a metade do sucesso de “Machuca”. Se não estiver ocupado com alguma série de TV ou com algum filme, ele promete voltar ao Brasil para acompanhar o lançamento de “Mala Junta” e participar de novos debates. Como mostrou no CineSesc, ele adora falar sobre cinema, sobre a luta dos Mapuche e relembrar Pedro Machuca, o menino pobre da periferia de Santiago, que deu nome e potencializou a fama do filme de Andrés Wood.

Vale lembrar que recente pesquisa do IMDb, que apontou os melhores filmes da América Latina (entre os eleitos, estão o cubano “Memórias do Subdesenvolvimento”, o mexicano “Amores Perros”, o argentino “O Segredos seus Olhos”, o brasileiro “Cidade de Deus” e o uruguaio “Whisky”), escolheu “Machuca” como o melhor filme chileno.

 

Por Maria do Rosário Caetano

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